Paixões no Deserto



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Coleção Amor e Sedução - 3

Paixões no Deserto

Hot Sand, Hot Love



Loreley McKenzie

Christopher era um homem com o destino marcado por uma profecia. Lindsay, uma jovem que vivia sonhando com um mundo que não era o seu. Quando ela decide fazer a viagem de seus sonhos, os caminhos de ambos se cruzam de forma inexorável.

Em um ambiente de mistério e sedução, entre as paisagens deslumbrantes da Tunísia e as dunas do Saara, Lindsay embarca numa aventura emocionante, onde o perigo, a paixão e o misticismo se unem para forjar um romance digno das Mil e Uma Noites!



Disponibilização: Marisa Helena

Digitalização: Vicky B

Revisão: Marlene C.

PAIXÕES NO DESERTO

Título original: Hot Sand, Hot Love

© 2005 MYTHOS EDITORA LTDA.

DIRETORES Dorival Vitor Lopes Helcio de Carvalho

EDITORA Camila F. Nóbrega

TRADUÇÃO Milene Stromm

DIAGRAMAÇÃO Flavio F. Soarez (Design Company)

REVISÃO Cinthia Takeda Caetano

ILUSTRAÇÃO DE CAPA Alexandre Jubran

IMPRESSÃO Gráfica Cunha-Facchini

DISTRIBUIÇÃO Fernando Chinaglia Distribuidora


De todos os lugares mágicos deste planeta, nenhum seduz e encanta tanto por seus mistérios como o Deserto do Saara. Nestas páginas, você encontrará um pouco do poder e da magia dessa terra longínqua e misteriosa, além de uma história ardente de amor, paixão e perigo.

Boa leitura!
Com carinho,

Loreley McKenzie


Para meu pai, que me ensinou a amar o deserto. Para Vander, que me ensinou a amar.


Prólogo
O homem esgueirou-se pela janela lateral da enorme propriedade de Paul Edgar Tupper III, Duque de Pointpigeon, cuja esposa Célia tão gentilmente o havia recebido como o "arquiteto da rainha". "Meu Deus, como é fácil enganar esta gente! Deviam ser proces­sados pelo tamanho da burrice", pensou, enquanto se movia entre a escuridão da enorme biblioteca.

Ele sempre usava uma roupa toda preta e colada ao corpo, além de luvas e máscara, quando estava trabalhando. Isso o impedia de ser avis­tado escalando paredes mal iluminadas ou fugindo pelos telhados.

Sua minilanterna clareava os livros, enquanto ele tentava lembrar exatamente atrás de qual dos volumes a duquesa havia lhe dito que ficava o sensor do alarme. Sem dificuldade alguma desativou todos eles e abriu o cofre com tranqüilidade.

"Esse pessoal devia ter contratado um ladrão para montar o sistema de segurança", pensou, enquanto esvaziava a bandeja de veludo negro dentro de um saco de cetim da mesma cor. Antes, porém, deu uma olha­da nas pedras, luzindo sob o minúsculo facho de luz. Eram realmente únicas. Seus olhos nunca tinham contemplado nada parecido, e ele já havia visto jóias de todos os tipos.

Após um momento de hesitação, resolveu levar mais alguma coisa. Já que estava ali, por que não aproveitar?

Assim que terminou, fechou o cofre e religou o alarme. Saiu pelo mes­mo caminho por onde entrou e novamente não encontrou dificuldade.

Missão cumprida.

Na rua, assobiando tranqüilamente, cumprimentou o policial que fazia a ronda pelo bairro e caminhou até seu carro, sentindo-se no topo do mundo.



***

Saí do cinema me sentindo a heroína do filme. Era como se tivesse sido resgatada dos bandidos do deserto por aquele homem forte e vigoroso para, em seus braços, viver os mais ardentes sonhos de paixão e loucura.

Ao seu lado, eu enfrentaria perigos, desvendaria mistérios, cada dia seria uma nova e eletrizante aventura. Senti meu corpo todo se arrepiar com a idéia de estar ao lado de alguém como o herói da história.

Mesmo depois de tomar um banho e vestir uma camisola sem graça, ainda podia sentir sua presença em mim. Ele era meu sonho de consumo. Não o ator, é claro, mas o personagem que representava. Forte, másculo e muito, muito sensual.

Um homem capaz de me levar às alturas com seus carinhos e aque­cer meu corpo com um único olhar.

Agarrei o travesseiro, imaginando que agarrava meu salvador. Pela minha cabeça passavam imagens de noites estreladas e silenciosas, cortadas apenas por nossos gemidos e gritos de prazer.

Toda a sensualidade e calor das dunas ganhavam forma nos braços daquele ser apaixonante, que era só meu.

Adormeci assim, deixando que meus sonhos me levassem até ele e o encontrassem faminto por minha presença, por meus carinhos.

O Senhor das Dunas.

O Príncipe do Deserto.

O homem da minha vida.

Capítulo I
— Você leu sobre o roubo dos diamantes? Só se fala nisso agora! — puxou conversa a senhora ao meu lado, com ar de preocupação.

— Desculpe... eu não entendi...?

— O roubo dos diamantes do Duque! Onde já se viu? Nem a realeza respeitam mais! Por isso eu sempre digo para o meu filho...

Fiquei olhando para ela só por educação. Não fazia idéia do que a mulher estava falando... ou talvez fizesse, mas uma idéia muito vaga.

Tinha passado as últimas semanas preparando minha viagem para a África e minha atenção estava toda voltada para o dia em que finalmente o Saara e eu nos conheceríamos pessoalmente. Digo pessoal­mente porque, em sonhos, a gente já se conhecia muito bem. Eu tinha percorrido suas areias e desvendado seus segredos tantas vezes que até perdi a conta... e ele sempre me recebia de braços abertos.

Claro que em meus sonhos o sol não era aterrador e nem as noites congelantes. Neles, os tuaregues ainda percorriam as dunas em seus corcéis negros, espalhando magia e sedução com seus trajes azuis esvoaçando ao sabor do vento.

Não sei bem quando essa paixão pelo deserto começou. Em algum momento da infância minha alma foi roubada pelos mistérios e promessas que se escondem em meio à areia, sob os ventos quentes, entre as caravanas que percorrem a imensidão desolada em seu passo lento e monótono.

Alguém poderá dizer que isso é normal em crianças: sentir uma paixão por determinado lugar e ficar fantasiando com ele, até aparecer outra coisa. Muitas mentes infantis amam o deserto num dia e as gelei­ras da Antártida em outro.

Mas este nunca foi meu caso. Desde que me senti atraída pelo de­serto, passei a viver esperando o dia de poder realizar meu sonho: ir para a África e percorrer o Saara de norte a sul.

Enquanto minhas amiguinhas brincavam de Cinderela e Bela Ador­mecida, eu sonhava com Sherazade e as Mil e Uma Noites. Enquanto elas esperavam que um príncipe loiro aparecesse para resgatá-las de algum perigo, eu queria mesmo é que um tuaregue de olhos escuros e cabelos anelados me levasse em seu cavalo negro até sua tenda, onde, aí sim, eu seria sua princesa.

Isso, é claro, causava muito desconforto aos meus pais, que não en­tendiam como eu havia herdado aquela tendência à vida nômade.

Conforme o tempo passava, minha paixão, em vez de diminuir e dar lugar a outros interesses, só aumentava. Passei a ler tudo que podia sobre o Saara e o povo tuaregue, ou kel tamashek, como prefere ser chamada essa gente tão antiga, cuja origem se perde no tempo.

Em poucos anos me tornei uma expert no assunto, para desgosto de meus pais e professores, que preferiam me ver dedicada a assuntos mais próximos de meu sangue inglês.

Mas não teve jeito. Eu sempre fui uma européia com alma berbere. De quem herdei isto não faço idéia, mas sei que, quando meu pai per­dia a paciência com as tendas que eu improvisava no quarto, ou com minha insistência para que o rosbife do jantar fosse substituído por tri­pas de carneiro e lentilhas, ele explodia:

— Essa menina puxou isso do seu tio Ernest! Aquele descabeçado que passou a vida percorrendo o mundo e deixou a família sem notícias durante anos! E, quando voltou a dar as caras, ainda tivemos que pagar as contas que o infeliz trouxe!

Sobre isso não posso falar muito, já que nunca conheci o tio de minha mãe, mas imagino que ele tenha sido uma figura muito interessante.

Lembro muito bem que, em um Natal, quando eu tinha 12 anos, minha avó, querendo agradar, me deu de presente um livro sobre tradições dos povos do deserto. Naquele dia, achei que meu pai ia ter um ataque:

— Mas será possível? Nós aqui fazendo de tudo pra tirar essas idéias da menina e vocês aparecem pra incentivar?!

— Deixe! — respondeu meu avô com a sabedoria de seus cabelos brancos. — Isso é só uma fase. Quando era garoto eu queria ser pirata e nem por isso virei um!

Talvez fosse verdade para meu avô, mas não para mim. Eu sabia que um dia iria embora da Inglaterra e que meu destino estava inegavelmente ligado às areias da África.

— Por isso eu sempre digo a meu filho: precisamos tomar muito cuidado! — continuava tagarelando a mulher ao meu lado sem que eu tivesse ouvido uma só palavra.

— A senhora estava falando sobre diamantes...? — respondi para ser educada.

— Isso foi há meia hora! — protestou ela, me encarando com cara de brava. — Eu estava falando sobre os perigos desta viagem. Ainda bem que Jordan vai conosco.

— Perigos? — perguntei, sem entender nada.

— Claro! Ainda mais para uma moça como você! Precisa ser muito cuidadosa, está ouvindo?

Do que ela estava falando, meu Deus do céu? Que perigos poderia haver no Saara? Todos, é claro, mas quem se importava com isso? E quem era Jordan?

— Dizem que se trata do maior ladrão de jóias do mundo!

Quem? O Saara? Ou Jordan?

— Desculpe... mas não entendi.

— O homem que roubou os diamantes. É o maior ladrão do mundo. Há anos tentam pegá-lo, mas ninguém consegue. E ele pode estar em qualquer lugar... até mesmo aqui! Neste vôo! Se não fosse por Jordan, eu nem saía de casa!

Eu ri duvidando muito que um ladrão fosse embarcar numa via­gem daquelas, em um vôo fretado por uma agência de turismo, mas fiquei quieta. E quem era o tal de Jordan?

Depois de muitas trocas de aeronaves e conexões, finalmente o pilo­to anunciou que estávamos chegando a Túnis, capital da Tunísia.

Senti meu estômago gelar e meu coração parar. Suspirei. Finalmen­te! Túnis não fica no deserto, evidente que não, mas eu já havia contratado uma excursão pelo país, que incluía, é claro, o Saara.

Seria nosso primeiro encontro... e eu ansiava por ele como uma noi­va à espera da noite de núpcias. Aliás, esta é uma questão interessante: será que hoje em dia, com toda a liberação sexual e relacionamentos íntimos, as noivas ainda anseiam pela noite de núpcias?

Eu não sabia a resposta. Nunca havia me casado e meus namoros sempre foram breves e sem importância. Não queria me prender a nin­guém para estar livre, esperando por ele.

Seu nome, eu não fazia idéia. Só sabia que seria um homem misterioso, que me roubaria o coração e tiraria meu juízo com seu amor. Romântica, não? Mas o que posso fazer? Sempre fui assim: uma romântica incurável.

— Eu bem que disse ao Jordan para irmos a outro lugar, mas ele insistiu tanto! — continuava a mulher, enquanto se preparava para a aterrissagem.

Sorri mais uma vez e resolvi prestar atenção na conversa, já que estávamos quase pousando.

— A senhora não gosta da África? — perguntei.

— Não é isso... Estas aventuras em terras estranhas... Isso não é para mim! Eu tenho natureza muito delicada, entende?

Concordei com a cabeça e olhei pela janela. Lá fora, pude ver o azul forte do Mediterrâneo e as casas da cidade cada vez mais perto. Mal podia acreditar que finalmente estávamos chegando.

Embora eu já tivesse devorado livros e mais livros sobre a África e o Saara, nada tinha me preparado para a situação que encontramos no aeroporto. Havia guardas fortemente armados e passamos horas na fila da revista de bagagem. Nossos passaportes foram checados e rechecados, e um homem de aparência antipática não parava de olhar para todo mundo com desconfiança.

— Estão procurando os diamantes! — cochichou a mulher ao meu lado, enquanto aguardávamos ser liberadas.

— Bem que eu desconfiei que o ladrão estava em nosso vôo. Já pensou o perigo que corremos? Um bandido internacional entre nós!

Olhei para ela com simpatia, imaginando o que teria acontecido se o tal bandido se revelasse no avião. No mínimo a mulher teria massa­crado o coitado com o guarda-chuva que carregava. Agora, para que ela estava levando aquilo, naquele lugar, era um grande mistério.

— Olhe! Lá está ele! — disse a mulher entusiasmada.

— O ladrão?! — perguntei surpresa.

— Não! Jordan, meu filho!

Olhei para onde ela apontava e vi um rapaz alto e forte se aproximando. Ele usava os cabelos penteados para trás, óculos quadrados de armação escura e parecia bem atrapalhado com as malas. As roupas indicavam que ele não devia fazer compras há muito tempo, e o mais surpreendente: levava um guarda-chuva igual ao da mãe.

Jordan esperava do outro lado da fila com ar perdido. "Coitado", pensei. "Esse não dá um passo sem a autorização da mamãe." Mas logo os acontecimentos me mostrariam que eu não podia estar mais enganada.

Depois de algum tempo, fomos finalmente liberadas, mas não antes da minha companheira de vôo ter passado um belo sermão no oficial da alfândega por ter deixado duas honestas inglesas - no caso, eu e ela - esperando por horas.

Pela aparência do homem, imaginei que ou ele não falava nossa língua ou já estava acostumado com reclamação de turistas, pois não deu a menor atenção à mulher.

— Venha, quero lhe apresentar meu filho! — disse ela, cheia de entusiasmo.

Sem saber o que fazer ou para onde ir, segui atrás, conformada.

— Jordan, quero que conheça minha amiga, a senhorita... senhorita...?

— Hill. Lindsay Hill. Como vai? — eu disse com um sorriso amarelo.

— Muito... prazer. Eu sou Jordan Burton...

— Veio no avião com a gente? Não me lembro de ter visto você. — perguntei apenas para falar alguma coisa.

— Estava no último assento. Teve uma confusão na agência de via­gem e acabamos ficando separados, a mamãe e eu.

Mamãe? Que homem naquela idade falaria mamãe? Olhei para ele com uma ponta de pena e muita ironia:

— Deve ter sido horrível viajarem separados, né?

— Que nada! — respondeu a Sra. Burton. — Jordan precisa conver­sar com outras pessoas. Esse menino trabalha tanto e nunca se diverte. Até estranhei ele querer tirar estas férias agora.

— Olhem! O pessoal da agência está ali! — eu disse, apontando para uma garota com ar desesperado que gritava sem parar:

— London Travel aqui! London Travei aqui!

Nós três nos juntamos a ela e às outras pessoas que faziam parte do mesmo pacote de turismo e embarcamos num ônibus confortável. O delicioso ar refrigerado salvou o grupo do sufocante calor da rua.

Ao meu lado, a Sra. Burton não parava de falar sobre o perigo que passamos e sobre as qualidades do filho. Tudo junto, numa mesma conversa, de forma que ficava impossível saber se ela estava elogiando o menino ou o ladrão.

Por fim, chegamos ao hotel: um edifício alto, cuja fachada em estilo árabe lembrava os castelos das Mil e Uma Noites. Recebemos nossas chaves e, não sei se por sorte ou azar, a Sra. Burton e filho ficaram nos apartamentos ao lado do meu. Um de cada lado para ser mais exata.

Maravilhada por estar na Tunísia, fascinada pelo deserto que me esperava, caí sobre a cama e senti a seda da colcha escorregar sob meu corpo. Fui até a janela, voltei à cama e de novo para a janela. Vi a cida­de espalhando-se abaixo de meus pés e inalei o aroma daquelas terras milenares que tanto fascinavam minha imaginação.

Deitada, deixando a magia do Oriente agir sobre mim, cochilei. Não fosse o barulho no quarto de Jordan, eu só teria acordado no dia seguinte. Mas, ao contrário, levantei apressada e, quando abri a porta, vi o rapaz caído no chão, com um ferimento na cabeça que começava a sangrar. Eu corri para ajudá-lo, e antes de desmaiar, ele perguntou:

— Onde está... meu guarda-chuva?



***

A mulher, que pela quantidade de rugas em rosto deveria ser mui­to, muito velha, sentou-se no chão, em frente ao homem alto e envolto em panos negros que a aguardava.

Os cabelos finamente trançados e o amuleto que trazia no pescoço denunciavam sua origem. Ela era uma tamashek. Mais que isso, era uma espécie de vidente e conselheira, cujo dever era determinar o caminho que todos os que ainda preservavam os costumes ancestrais deveriam seguir.

— O que tem para mim? — perguntou o homem, com voz forte e respeitosa.

— O momento é chegado, Fahir. A roda do destino começou a girar para você.

Fahir encarou os olhos baços pela cegueira que a mulher trazia como marca de nascença:

— O que devo fazer?

— Você tem uma missão a cumprir. A profecia antiga é clara: do ocidente virá aquela que dará à luz o guerreiro cujo espírito duelará usando as armas da sabedoria. É seu destino unir-se a essa mulher e preparar o que será colhido no futuro.

— Mas como vou encontrá-la? E se ela não me quiser?

Os lábios da vidente mostraram a sombra de um sorriso:

— Confie e aja. Aquilo que está escrito irá se cumprir.

— Mas como vou saber quem ela é? — insistiu o homem.

— Apenas confie. Você faz perguntas demais. — e com um gesto indicou que nada mais falaria.

Fahir se levantou e saiu, pensando que, por mais que quisesse con­fiar e acreditar naquilo, era impossível deixar tudo por conta do acaso. Foi até o pátio de sua casa e sentou-se ao lado da fonte de pedra. Ficou imaginando como seria se, em vez de voltar, ele tivesse permanecido na Inglaterra.

Filho de mãe tamashek nascida no Egito e pai inglês, Christopher Fahir Tabhet Lowell passou a infância no Cairo até a idade de 7 anos, quando a família se mudou para Londres, onde ele estudou e se formou em engenharia pela Universidade de Oxford.

Desde pequeno, o rapaz conhecia seu caminho. A mãe o preparou para o futuro e o pai, um homem prático e amante do conhecimento, parecia concordar com tudo que a esposa dizia.

Dois anos após terminar a universidade, Fahir sabia que precisava retornar ao Cairo. Na ocasião, não se sentia pronto para o que o aguar­dava e teve muitas dúvidas se afinal aquela história de profecia era verdade ou apenas uma das tantas crendices do povo de sua mãe.

Gostava da Inglaterra, gostava do Ocidente. A idéia de ter que se enfiar Saara adentro em um lombo de camelo, guiado por pessoas que nunca havia visto, e aprender os antigos costumes não o atraía nem um pouco.

Protelou o quanto pôde a decisão de partir, até que uma noite foi visitado, em sonhos, por uma mulher muito velha, com olhos opacos e voz estranha. Ela lhe disse muitas coisas sobre seu povo e também o que aconteceria caso o rapaz se recusasse a cumprir seu destino.

Os tamasheks, outrora um povo orgulhoso e sábio, viviam sepa­rados de seu mundo, que era o deserto, espalhados por vários países onde sua cultura e costumes, além de não respeitados, serviam apenas para embalar a fantasia dos turistas.

E eles não podiam se perder assim. Os jovens errantes, as meninas prostituídas. Eles eram descendentes dos mais primitivos habitantes do Egito, eram os guardiões do conhecimento sagrado - conhecimento que deveria permanecer oculto e bem guardado até o momento de ser revelado à humanidade.

Ao acordar o rapaz já estava decidido a regressar.

Isso havia acontecido há quase dez anos e Fahir, desde então, se tornara outra pessoa. Mais sério, mais duro, mais calado. Ouvia mais do que falava. Aprendeu a observar e sentir as mudanças sutis no comportamento e expressões das pessoas; aprendeu a conhecer os mistérios das areias e a sobreviver entre eles.

Dedicou-se à escrita tifinarh, não estudada pelos arqueólogos, e conseguia ler as antigas inscrições deixadas por seus antepassados no deserto.

Instruiu-se também na "linguagem muda", usada para transmitir mensagens secretas e empregada tanto em transações comerciais quan­to nas relações amorosas - o dedo indicador traça complexos ideogra­mas na palma da mão daquele a quem se dirige a mensagem.

Ele aprendeu muito mais coisas e seus conhecimentos se tornaram quase uma lenda.

Para muitos, Fahir era o Príncipe do Deserto, o Senhor das Dunas. Para outros, era o sofisticado milionário inglês que havia escolhido a Tunísia para viver, mas ocasionalmente viajava pelo mundo. Para os poucos que desfrutavam de sua amizade, ele era um homem sábio e solitário, extremamente leal com aqueles que o ajudavam e impiedoso com quem o traía.

Transitava com a mesma desenvoltura pelos salões atapetados dos governos e pelas areias do Saara, despertando respeito e admiração por seus modos educados e pela sabedoria de suas palavras.

Todas estas características reunidas em um só homem faziam de Fahir o centro das atenções femininas por onde quer que passasse.

Entre as mulheres do povo de sua mãe, usando o véu que lhe cobria o rosto e deixava à mostra apenas os impressionantes olhos azul-esverdeados, herdados do pai, ele provocava suspiros e olhares ardentes.

Entre as ocidentais, sempre vestindo ternos e roupas elegantes, que insinuavam seu porte atlético e corpo musculoso, ele provocava bem mais que isso. Mas Fahir não era do tipo casanova. Ao contrário: não gostava das mulheres que se ofereciam abertamente, e isso nada tinha a ver com a tal profecia. Era um traço de sua personalidade. Preferia mulheres simples e sinceras, que esperavam ser cortejadas antes de pular em seu pescoço com ar de devoradoras sexuais.

Claro que saía com as moças e tinha alguns casos discretos, mas nada que pudesse comprometer a ele ou à pessoa com quem estivesse na ocasião. "Sou um tipo esquisito", dizia para si mesmo cada vez que pensava no assunto.

Agora, sentado ali, ouvindo a água correndo na fonte, seus pensamentos estavam na tal mulher que a anciã afirmou ter chegado. E se ele não gostasse dela? Ou ela não gostasse dele? E se a profecia não se cumprisse?

Fahir odiava quando ouvia as pessoas se referirem a seu povo como tuaregues. O significado da palavra - esquecido por Deus - era ofensivo e não verdadeiro. Eles não haviam sido esquecidos! Apenas se recusavam a aceitar a religião imposta pelos missionários..

Sua gente era responsável pela guarda de uma caixa contendo o maior segredo da humanidade. De geração em geração, desde que começaram a caminhar pelo mundo, esse segredo era entregue a um responsável, que o passava para outro quando se via perto da morte. E foi assim até que, no século XIX, durante uma investida dos colonizadores, a caixa se perdeu.

Durante décadas, os tamasheks buscaram por ela, mas só o pai de sua mãe conseguiu recuperá-la. Dentro da caixa, encontraram o cálice de pedra que, segundo a tradição, havia sido esculpido na primeira rocha do mundo. Mas as jóias que o guarneciam, cuja importância era fundamental, haviam sido roubadas.

Essas gemas possuíam uma lapidação especial e única. Sem elas, o cálice perderia seu valor.

Somente o guardião do cálice sabia como usá-lo. Ao receber do pai as instruções e a responsabilidade pela proteção do objeto, Fahir também recebeu a incumbência de descobrir e devolver as pedras precio­sas a seu lugar de origem. "São tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo", pensou ele, preocupado.

— Fahir? — indagou um homem alto, usando as trajes negros que deixavam à mostra apenas seus olhos mais negros ainda.

— Fale, Maghrabi.

— O Sr. Jordan Burton chegou a Túnis.

— Muito bem. Disse quando podemos vê-lo?

— Ele fará uma excursão pelo país e deverá chegar ao deserto em dez dias.

— Cuide para que tudo corra bem até lá, Maghrabi.

O homem curvou-se e saiu. Fahir deixou a imaginação vagar por algum tempo.

Estava perto de recuperar as pedras. Estava perto de conhecer a mulher que traria ao mundo seu filho, que segundo a profecia seria o responsável por recuperar a história e o orgulho dos tamasheks. Mas, e se tudo aquilo não passasse de lenda, um mero engano?

— Não duvide, Fahir. — disse a voz em sua cabeça. Mas ele duvidava. Ah, como duvidava!

Muito ainda precisava ser feito para que tudo desse certo em seu encontro com Jordan, o antigo colega de universidade que agora se de­dicava a um ramo, digamos, menos ortodoxo de trabalho. Fahir deu uma risada ao lembrar-se do amigo com quem tantas vezes tinha saído para farrear em Londres.

— Com licença, Fahir. — disse novamente Maghrabi entrando discretamente com seus passos de leão, que ninguém conseguia ouvir.

— O que foi?

— Atacaram o Sr. Jordan no hotel. O quarto dele foi completamente revirado.

— Eu mandei que a segurança fosse redobrada. — a voz de Fahir era apenas um sussurro, demonstrando que o homem lutava contra uma raiva intensa.

— Aconteceu antes de nossos homens chegarem.

Fahir encarou o interlocutor e perguntou, para surpresa do homem:

— O guarda-chuva ainda está com ele?


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